Os Papas do Século XIII – Tempos de Espiritualidade Renovada!

23/10/2014 11:48

Traçaremos agora o perfil, através da história dos santo padres, de um século importantíssimo para a Santa Igreja. Foi durante o século XIII que surgiram duas das maiores ordens religiosas: os mendicantes de São Francisco e os pregadores de São Domingos. Sou muito suspeito para falar, pois são dois dos santos que mais amo – com perdão a outros grandes homens que viveram o amor a Cristo, como São José Moscatti, São Pio e São Martinho (esse último então, só em mencionar seu nome meus olhos enchem d’água).

Bom, mas o assunto aqui são os ocupantes do trono do pescador, vamos a eles.

papa_inocencio_IIIInocêncio III – Não é exagero dizer que Inocêncio III foi um dos papas mais marcantes e importantes da história. Basta dizer que o mais importante Concílio da Idade Média – o IV Concílio de Latrão – foi convocado por ele.

O nobre Lotário di Segni (nome de batismo de Inocêncio III) era de uma família abastada e teve uma educação requintada. Culto e politicamente consciente da realidade que o cercava, Inocêncio III destacou-se na defesa dos interesses da Igreja e na continuação da Reforma iniciada pelo Papa Gregório no século XI (ver posts anteriores). Reafirmou o controle papal sobre os Estados Pontifícios e ampliou-os, tendo para isso prometido apoio à coroção como Imperador de Otto de Brunswick; este, por sua vez, vacilou feio ao invadir a Sicília, o que levou o papa a transferir seu apoio a Frederico da Sicília.

Enquanto isso, Robin Hood e seus homens alegres (ui!) estavam às voltas com o Rei João Sem-Terra, irmão do falecido e afrancesado Ricardo I Lionheart (é mais bonito que “Coração de Leão”), um cara que – sempre esquecem de falar nos filmes de Roliúdi – apesar de Rei, detestava a Inglaterra. Bom, Little John não ficava muito atrás, e era um Rei muito burro; tão burro que, por causa dele, promulgou-se a primeira constituição. De presente, o Papa deu a João uma excomunhão, porque este recusou-se a reconhecer o arcebispo de Canterbury, Estevão Langton. João do MST então voltou atrás para ter revogada sua punição e, consequentemente, enredou o Papa em seu conflito interno (lembrem-se que não havia internet para acesso rápido a informações) que acabou por julgar improcedente a Magna Carta da Inglaterra. Temos aqui mais uma página da já conhecida revolta dos ingleses com a Santa Igreja. Nunca confie em ninguém do MST.

Inocêncio III foi um lutador tenaz contra as heresias e um dos papas mais odiados pelos historiadores de esquerda, ou seja, 99% dos historiadores (eita profissão escrota). Isso porque ele convocou a única cruzada direcionada a combater dentro do próprio Ocidente: A Cruzada contra os hereges Albigenses ou Cátaros; eternos queridinhos e “pobres inocentes de Cristo” para protestantes e esquerdões em geral. O que somente qualifica-o como um verdadeiro homem de Deus.

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Inocêncio III aprovando a regra dos Franciscanos

Um dos mais dramáticos eventos desde período diz respeito à convocação da Quarta Cruzada. O Papa convocou a cambada de sempre, com a diretriz anteriormente dada pelo Papa Urbano II quando da Primeira Cruzada: LIBERTEM A TERRA SANTA!!!!! Acontece que alguns engraçados resolveram fazer um pequeno desvio para Veneza, e de lá para Constantinopla, a qual caiu pela primeira vez… Derrubada por cristãos. Mas que fique bem claro: NUNCA, EM MOMENTO ALGUM DA HISTÓRIA, O PAPA QUIS DESTRUIR O IMPÉRIO ORIENTAL. Isso fica evidenciado no horror de Inocêncio pelo rumo que as coisas estavam tomando.

Horror era pouco: a barbárie comeu solta na Europa Oriental. O Papa convocou a cruzada, tuuuuuuudo bem. Mas que culpa ele teve de um bando de principinhos malucos tomar conta da situação e resolver fazer o que lhe desse na telha? Esperamos suas cartas.

Em 1215, o papado de Inocêncio encontrou seu auge ao iniciar-se o IV Concílio de Latrão, que apresentou ao mundo a Ordem dos Frades Menores, chefiada espiritualmente por um certo Santo de Assis. Mas seu principal legado, em minha opinião, foi estabelecer um sistema jurídico, que, mais do que tão somente aplicável à Santa Igreja, dirige toda nossa vida até os dias de hoje. As noções de certo e errado que norteiam a sociedade ocidental – independente de crença religiosa, quer goste ou não ateus, chatos, crentes e árabes – são aquelas legadas pelo Concílio de Latrão, e vêm dos tempos de Inocêncio III.

Esse grande Papa faleceu antes de ver seu novo projeto concretizado, a Quinta Cruzada, em 1216. Papa de 1198 a 1216.

Honório III - Continuou a obra de seu antecessor no plano espiritual, livre que estava, até certo ponto, em virtude da estrutura temporal que Inocêncio III havia propiciado à Santa Igreja. Coube a Honório confirmar dominicanos, franciscanos e carmelitas. No campo político, viu o naufrágio da Quinta Cruzada, idealizada pelo seu antecessor. Já deu pra ver que essas cruzadas eram a maior furada. Coroou o Imperador Frederico II e regularizou mais claramente a eleição papal.

Vamos continuar a montar um pouco mais o quebra-cabeça que é a Santa Inquisição. Sempre se ensina que o Papa Inocêncio e os dominicanos são os iniciadores do processo inquisitorial. Verdade, em parte. A direção espiritual da Inquisição realmente pertencia aos filhos de São Domingos, e isso deveu-se muito às normas estabelecidas por Honório III. Por outro lado, vejam que este papa homologou as ordens de Frederico e Luiz VIII (que nunca são citados como co-criadores – fica feio o Imperador de um futuro país protestante e um Rei da pátria amada, salve, salve da esquerdalha participarem desse “crime contra os sábios hereges que combatiam a Igreja malvada”). Nosso embotamento pós-iluminismo que transforma nossa massa encefálica em massa criogênica impede-nos muitas vezes de fazer uma análise com base na realidade.

Em 18 de março de 1227, partiu desse mundo Honório III. Papa de 1216 a 1227.

Gregório IX - Ugolino di Anagni publicou a bula “Licet ad Capiendos”, que instituiu a Santa Inquisição. Era o dia 20 de abril de 1233. Eis o texto da dita:

“Onde quer que os ocorra pregar estais facultados, se os pecadores persistem em defender a heresia apesar das advertências, a privar-los para sempre de seus benefícios espirituais e proceder contra eles e todos os outros, sem apelação, solicitando em caso necessário a ajuda das autoridades seculares e vencendo sua oposição, se isto for necessário, por meio de censuras eclesiásticas inapeláveis.”

Fonte: Portal São Francisco

Cadê a foguerinha? Li isso no texto não. Valha-me Deus!!!! E olha que apesar do nome, esse portal aí não é católico e nem pró-Igreja, basta continuar a ler o resto do texto. Fiz de propósito para vocês verem como essa gente é capaz de ludibriar se utilizando até do próprio texto da Igreja. Tem certeza que você, caro leitor, é capaz de interpretar um texto?

Fora Isso, Gregório IX reabriu a Universidade de Paris e modificou o interdito a respeito dos textos de Aristóteles. É isso aí, filosofia grega na veia gente. Aliás, filosofia é filosofia grega, o resto é invenção de desocupado. Enquanto isso, o imperador Frederico II largou as cruzadas e voltou para casa porque, ao que parece, o sol mediterrâneo do Oriente Próximo (não fujam da aula de geografia crianças – Oriente Médio é só Irã e Afeganistão, todo o resto que a reportalhada burra classifica como “Oriente Médio” é na realidade “Oriente Próximo”) fazia mal a sua cútis germânica delicadérrima (na verdade, ele correu da chibata) .

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O Papa Gregório IX excomungando o imperador Frederico II. Afresco de Giorgio Vasari, Vaticano

De presente, o imperador fujão ganhou uma excomunhão (eita, que rima horrível!). Para fugir do fogo do inferno e obter o perdão do Papa, Frederico II partiu para Jerusalém. Só que o papa não gostou da gracinha do Fredericão e muito menos de ter um excomungado como líder de um exército cristão de libertação. Isso desencadeou uma guerra de consequências trágicas.  Vencendo as forças do Papa, Frederico acordou uma paz em 1230, que perdurou por algum tempo. Mas, como todo bom imperador, o poder subiu à cabeça do Fredericão e ele achou de fazer do Papa seu títere: queria que o pontífice excomunga-se todos aqueles que se opusessem ao poder imperial. O Papa excomungou… excomungou o imperador pela segunda vez.

Frederico então botou seu bloco na rua e sitiou Roma. Foi mais do que o velho Papa pôde suportar. Debaixo de um calor escaldante e com a cidade tomada, veio a falecer. É bom dizer também que foi Gregório IX que canonizou São Domingos, São Francisco e Santo Antônio de Pádua. Papa de 1227 a 1241.

Celestino IV – O fato mais relevante da eleição de Celestino IV diz respeito ao fato dele ter sido o primeiro Papa a ser eleito por um conclave. Durante 60 dias, oito bispos ficaram reunidos para deliberar a respeito do próximo ocupante do trono de Pedro. Levou Celestino IV, mas só ficou no pontificado por exato 17 dias, nem chegando a ser consagrado e sem desempenhar nenhum ato oficial.

Credita-se a esse ex-monge cisterciense a autoria de uma magnânima “História da Escócia”. Papa em 1241.

Inocêncio IV – Sinibaldo Fieschi foi um lutador. Por conta do imperador Fredericão II, o trono do Papa ficou vacante por dois anos. Inocêncio IV peitou o Imperador e teve que fugir de Roma em 1244, só retornando quando o Imperador faleceu, em 1250.

No exílio, em Lyon, o Papa convocou um Concílio, no qual Frederico II foi considerado perjuro, sacrílego e herege. O imperador apresentou uma defesa que foi aceita, dois anos antes de sua morte. Bom, em 1251 o Papa volta a Roma, mas, como quem sai aos seus não degenera, o herdeiro de Frederico II, Conrado IV, continuou o trabalho do pai de infernizar o vida do Papa, negando a este a supremacia sobre a Sicília. Conrado IV morre subitamente e o Papa se aboleta na Sicília para garantir sua pose contra as pretensões imperiais. Ali veio a falecer, em 1254.

Papa de 1243 a 1254.

Alexandre IV - Por conta das lutas comezinhas desses tempos, o Papa pouco parava em Roma. O filho bastardo de Frederico II, Manfredo, apoderou-se de muitas terras pontifícias. A verdade é que, com os cofres vazios e sem uma força força militar para fazer frente ao bastardo, o Papa acabou quase sempre perdendo os conflitos.

A residência oficial do Papa passou a ser Viterbo e ali ele veio a falecer, em 1261. Papa de 1254 a 1261.

papa_urbano_ivUrbano IV – É engraçado o caso da eleição de Urbano IV (Jacques Panteleão): ele apenas estava passando por Viterbo – dando uma força para a rapaziada envolvida nas lutas pelos Estados Pontifícios – e acabou no trono de Pedro sem nem perceber direito como.

Jacques Panteleão foi eleito patriarca latino de Jerusalém por Alexandre IV. Quanto este morreu, Jacques foi eleito Papa, após uma sede vacante de três meses, e adotou o nome de Urbano. Iniciou o processo de “Chute no rabo” dos Hohenstaufen (a família do imperador Frederico II) pra fora dos Estados Pontifícios e prometeu a Carlos D’Anjou torná-lo rei de Sicília e Nápoles em troca de uma grana (a coisa tava feia), liberdade para a atuação do padres e ajuda militar.

Manfredo, o bastardo, tocou o horror na Toscana e nos Estados Pontifícios. Em Orviedo, por conta da pressão, foi preciso mudar o tratado firmado com Carlos e engolir a eleição de Manfredo como senador romano. Mas Orviedo também foi sitiada e o Papa fugiu para Perugia, onde faleceu em outubro de 1264.

Foi Urbano IV que instituiu o Corpus ChristiPapa de 1261 a 1264.

Clemente IV - Mais um Papa sem casa. Foi eleito, segundo algumas fontes, graças à influência de São Luiz. Foi advogado e soldado. Cumpriu o acordo de seu antecessor, empossando Carlos D´Anjou como Rei da Sicília e Nápoles.

Em Benevento, Manfredo foi assassinado pelo exército francês a mando de Carlos. Aproximou-se da Igreja Oriental. Veio a falecer em Viterbo e foi sepultado no mosteiro dominicano de Santa Maria in Grandi. Em 1885, seus restos foram transladados para Basílica de São Francesco, na mesma Viterbo. Papa de 1265 a 1268.

Gregório X - Sempre que se tem um conclave, ficamos na maior apreensão para saber quem será nosso novo Papa. Agora imagine um conclave que fica reunido por, nada mais, nada menos que… TRÊS anos? Foi isso que aconteceu quando da escolha de Gregório X.

A coisa ficou tão feia que o povo de Roma, depois de três anos, perdeu a paciência e arrancou o teto do palácio (eles estão em Viterbo) onde estavam reunidos os cardeias e ameaçou deixá-los morrer de fome caso não elegessem um Papa JÁ!

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Os irmãos Polo diante de Gregório X

Tedaldo Visconti foi considerado um candidato de consenso. Italiano, não vivera sua vida metido nas picuinhas da terra da pizza. Sua maior ocupação quando eleito não era ser Papa, mas sim os preparativos para Nona Cruzada na Palestina. Ajudou os irmãos Polo, Nicolau e Mateus – tio e pai de Marco Polo, respectivamente – quando eles voltavam da China, governada pelo neto de Genghis Khan, Kublai.

Em Roma, Gregório X convocou um novo concílio, a ser realizado em Lyon, em 1274. Foi no regresso de uma das sessões do concílio que faleceu, em Arezzo (não confundir com marca de sandália).

Por conta da bagunça que acabou virando sua eleição, Gregório X escreveu a bula Ubi Periculum, subsequentemente incorporada no Código de Direito Canônico, que regulava os conclaves que só poderiam durar, no máximo, dez dias.

Foi beatificado em 1713. Papa de 1271 a 1276.

Inocêncio V – Foi chamado de Doctor Formosissimus, tal a beleza de suas pregações. Foi o primeiro Papa dominicano e teve como professores o maravilhoso São Alberto Magno e a maior mente que já viveu neste mundo – São Tomás de Aquino – é pouco ou quer mais? E a gente  aqui “gambando-se” de ser aluno da Tia Teteca.

Destacou-se no II Concílio de Lyon e pronunciou a oração fúnebre de São Boaventura (tanta gente inteligente junta, e aqui “pessoas” acham o Caetano Veloso “ginial”). Uma pena seu pontificado ter sido breve.  Papa em 1276, por apenas cinco meses.

Adriano V - Mal teve tempo de dizer oi. Adriano V foi apenas um nome com algumas realizações e, como Papa, nada pôde fazer. Saiu de Roma durante uma onda de calor (pra quem não sabe, durante a Idade Média, a temperatura variou 10 ºC para cima. As tais desgraças do dito “aquecimento global” segundo a canalha informa nos “telijurnais” dariam-se com uma variante de 2 ºC. Isso é que eu chamo de chamar o povo de idiota – mas claro, o mundo é lindo) e faleceu em Viterbo.

Seu grande legado acabou por ser seu túmulo, considerado uma obra-prima de Arnolfo di Cambio. Papa em 1276.

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Temos ainda muita coisa para falar dos Papas do Século XIII, na segunda parte veremos mais desse tempo instigante.

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